O Sr. Dussel contou muita coisa que não sabíamos sobre o mundo lá fora. Ele tinha notícias tristes. Incontáveis amigos e conhecidos foram levados para um destino terrível. Noite após noite, veículos militares verdes e cinza cruzam as ruas. Eles batem em todas as portas, perguntando se ali mora algum judeu. Em caso positivo, toda a família é levada embora. Caso contrário, eles passam para a outra residência. É impossível escapar de suas garras a não ser que você se esconda. Eles costumam andar com listas, só batendo nas portas onde sabem que há uma grande apreensão a ser feita. Frequentemente oferecem recompensa, tantos florins por cabeça. É como as caçadas a escravos nos tempos antigos. Não quero fazer com que isso pareça bobagem; é trágico demais. À noite, quando está escuro, costumo ver longas filas de gente boa e inocente acompanhada por crianças chorando, andando sem parar, controladas por um punhado de homens que as empurram e batem até elas quase caírem. Ninguém é poupado. Os doentes, os velhos, as crianças, os bebês e as mulheres grávidas — todos são forçados a marchar em direção à morte.
Temos muita sorte aqui, longe do tumulto. Não pensaríamos sequer por um minuto em todo esse sofrimento se não estivéssemos tão preocupados com as pessoas queridas, a quem não podemos ajudar. Sinto-me má ao dormir numa cama quente, enquanto em algum lugar meus melhores amigos estão caindo de exaustão ou sendo derrubados.
Fico apavorada quando penso em amigos íntimos que agora estão à mercê dos monstros mais cruéis que já assolaram a terra.
E tudo porque são judeus.
Diário de Anne Frank (Edição Definitiva), pgs.: 79, 80, Editora Record.
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