sábado, 2 de junho de 2012

Infeção Hospitalar/ Eclesiástica



Pr. Joed Venturini
http://joedventurini.blogspot.com.br/

             A história é comum a qualquer consultório médico. O doente se queixa de ter apanhado uma infeção grave justamente onde deveria tratar de sua saúde. “Doutor” dizem com voz grave e ar acusador “fui lá com uma simples dor de garganta e saí com uma pneumonia bilateral” e em seguida conta o rol de tratamentos complicados e procedimentos dolorosos a que se teve de submeter para se livrar de algo que apanhou no ambiente hospitalar.
            Do ponto de vista da lógica, o ocorrido nem é tão estranho assim. Todos sabemos que o ambiente hospitalar é o mais infetado que existe. Afinal, praticamente todos que para li se dirigem levam algum tipo de problema físico e boa parte carrega germes, bactérias e vírus deixando depois o agente infecioso no ambiente. A probabilidade de um doente, já com as defesas baixas, adquirir algo nesse contexto é alta. Por isso mesmo os médicos procuram tratar os doentes ambulatoriamente e uma vez internados procuram diminuir o mais possível o tempo de permanência no hospital.
            Por outro lado, não deixa de ser um pouco estranho e até contraditório, que o local onde se vai buscar o tratamento seja a origem de tantas mazelas e por vezes mesmo de problemas que se tornam fatais. Se não posso confiar no hospital para me tratar e tenho que temer seu ambiente, fica difícil saber o que fazer quando estou doente. Isso se torna ainda mais evidente quando leio e descubro que boa parte dessas infeções hospitalares só se adquirem exatamente nesse ambiente e não as apanhamos em nenhum outro lugar.
            Ora, o que isso tem a ver com a igreja? Muito! Não é de hoje que se compara a igreja a hospitais. Assim como os hospitais existem para tratar os doentes, a igreja existe para ajudar a resolver a maior de todas as doenças, a do espirito. Assim como os hospitais tem gente preparada para lidar com os doentes a igreja deveria ser formada por ex-doentes prontos a compartilhar a cura com os que a procuram. Assim como no hospital se efetuam os tratamentos que restaurarão a saúde, na igreja se administram as bênçãos que restauram a alma e o espirito para a comunhão com Deus. Mas infelizmente as comparações não ficam por aqui. Se nos hospitais se corre o risco de adquirir infeções únicas e graves, também na igreja há riscos de se cair em pecados que fora dela seriam risco bem menor.
            São pecados próprios da realidade eclesiástica, que as pessoas de fora da igreja não experimentam mas que grassam no seu meio. Exatamente no lugar onde deveríamos lidar com nossos pecados e descobrir como nos livrar deles e de suas consequências, corremos o sério risco de adquirir pecados bem específicos e graves para nossa saúde espiritual. Pensemos em alguns dos mais comuns:
            Hipocrisia: talvez a mais comum das infeções eclesiásticas. E se é verdade que fora da igreja também vemos hipocrisia, a realidade é que a hipocrisia que vemos nela tem características únicas e é provocada exatamente pelo ambiente eclesiástico. Estamos falando daquele fingimento que ataca os crentes de modo particular. A vida dupla que se desenvolve naqueles que no domingo vestem uma roupa diferente (domingueira), falam uma língua própria (evangeliques), olham de um modo especial (altivez de santo) e se comportam como se fossem melhores que a maioria dos mundanos sem Jesus. Esse mesmo personagem gravemente infetado vive de segunda a sábado exatamente como o mundano que condena no domingo. Vê as mesmas novelas e filmes, surfa os mesmos sites pornográficos na net, usa a mesma linguagem pesada, conta as mesmas mentiras, engana igualmente nos impostos, mostra total descontrole do temperamento, reage e pensa como se Deus não existisse na prática. Mas no domingo o infetado parece sofrer de uma amnésia parcial e seletiva. Esquece de como viveu durante a semana e condena viva e brutalmente aqueles que fazem exatamente o que ele fez.
Ora essa hipocrisia é adquirida no ambiente eclesial. Trata-se de um conjunto de pressões que levam o individuo a sentir que precisa fingir para ser aceito. Talvez o primeiro caso registrado dessa infeção seja o de Ananias e Safira em Atos 6. O doente não percebe a gravidade de sua doença. Não entende que ela nega a graça de Deus e a comunhão dos santos. Desconhece que em sua progressão essa patologia leva à esterilidade espiritual e a falta total de comunhão com o Senhor.
Orgulho “Santo”: infeção próxima da anterior mas com sintomas um pouco diferentes. Trata-se da autojustificação de quem se esforça nas “coisas” de Deus, que se aplica na “obra” de modo por vezes sacrificial e que ocupa posições e cargos considerados importantes ou híper valorizados pelo próprio infetado. Esse orgulho leva o doente a achar que vale mais que todos, que a vida da igreja depende dele, que ninguém é capaz de se comparar a ele em importância e valor, que seu trabalho é insubstituível e que seu galardão será o maior de todos. Essa espécie de mania de grandeza espiritual afeta muitos crentes e é grave. Provoca ilusões e alucinações, leva por vezes mesmo a formação de seitas e outros grupos onde a infeção do portador inicial se torna uma verdadeira “peste negra” da igreja. São os donos da verdade. Os detentores da ortodoxia original ou então os descobridores da verdade final.
Essa infeção leva o doente a esquecer que tudo vem de Deus, que a graça é sempre soberana, que nada temos que não tenhamos recebido, que o corpo de Cristo é composto por muitos membros e todos são valiosos e necessários. Essa infeção cega o doente para o valor de seu irmão, torna-o surdo para a verdade proclamada pelo outro, e fecha o raciocínio para tudo que não seja de origem própria. Nas fases finais costuma levar a afastamento da igreja e eventual morte espiritual.
Exclusão: Esta outra infeção é também comum em meio eclesiástico e muito triste porque nega a verdade bíblica e a própria razão de ser da igreja. Trata-se de uma forma de depressão gravíssima que atinge aqueles que uma vez na igreja se vem cercados por orgulho, vaidade e que são excluídos de certos grupos “superiores”. Tendo vindo do mundo onde não percebiam o amor de Deus, esses doentes encontraram na igreja a fonte da graça Divina. Mas depois, com o tempo de convivência, perceberam o pecado na igreja, a hipocrisia dos crentes, a falta de amor da maioria, o egocentrismo de boa parte dos “irmãos” e entraram em confusão. Se no lugar onde se diz conhecer a Deus e receber os ensinos de Jesus se vive assim então não deve haver saída. O doente entra em desânimo profundo, afasta-se desiludido e acaba por ser um caso muito difícil de recuperar porque já experimentou todos os tratamentos e se tornou imune a eles.
Neste caso há falta de clareza de pensamento. Por vezes expectativas altas demais. É comum julgar-se o todo por um ou dois indivíduos e as generalizações, sempre perigosas, tomam conta do raciocínio levando ao desespero e a falta de esperança numa solução. Por fim a cegueira impede que o doente veja qualquer sinal da graça por mais evidente que seja e a anemia espiritual atinge a gravidade máxima.
Conclusão: talvez alguém me ache exagerado nessas descrições. Gostaria muito que tivesse sido só isso. Infelizmente infeção hospitalar e a sua congénere eclesiástica, são coisas muito sérias e precisam de ser tratadas como tal. Como em quase todos os casos o reconhecimento é o primeiro passo. Precisamos identificar as situações de pecados próprios da igreja e combatê-los de modo proactivo.
Para a hipocrisia o tratamento é a humildade;
para o orgulho é a imersão na realidade do corpo de Cristo;
para a exclusão é a realização da graça extraordinária mesmo no meio das falhas e fraquezas.
Humildade se ganha servindo; a realidade do corpo se adquire percebendo a diversidade de dons e apreciando os talentos de todos; a verificação da graça se percebe não deixando que o maligno nos encha com as mazelas dos outros mas ouvindo e louvando pelas bênçãos em tantas vidas transformadas.
Infeção eclesiástica esta aí. Esteja atento e combata já!

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