quinta-feira, 20 de junho de 2013

O povo está na rua. E a igreja?

      
Brasília-DF, 17/06/2013

“A justiça é o amor corrigindo tudo aquilo que revolta contra o amor”
                                                                                   Martin Luther King

por George Gonsalves

O Brasil está pegando fogo! O povo brasileiro, costumeiramente chamado de acomodado e conformado, está nas ruas. É verdade que se trata de uma parcela apenas, na sua esmagadora maioria, jovens. Também é verdade que as reivindicações são fluidas: diminuição das tarifas de transporte público, melhoria na educação e saúde, reclamação sobre gastos com a copa do mundo, diminuição de impostos, rejeição da PEC 37 (que limita a atuação do Ministério Público), etc e etc. E, finalmente, há um grupo de baderneiros e vândalos infiltrados entre os que protestam legitimamente. Mas, não devemos ignorar o anseio de mudanças que vem das ruas. E a igreja? Onde está? Como ficam aqueles que são chamados para ser luz para este mundo?       
    O cristão deve ansiar por justiça social, porquanto Deus é justo. No Antigo Testamento o salmista revelou o olhar de Deus sobre a opressão dos poderosos contra os pobres: “Por causa da opressão dos pobres e do gemido dos necessitados, eu me levantarei agora, diz o Senhor; e porei a salvo a quem por isso suspira” (Salmo 12:5). Os profetas também alertaram: “Ai dos que decretam leis injustas, dos que escrevem leis de opressão, para negarem justiça aos pobres, para arrebatarem o direito aos aflitos do meu povo, a fim de despojarem as viúvas e roubarem os órfãos!” (Is. 10:2). O Novo Testamento também ecoa a voz de denúncia de opressão. Tiago afirma que os clamores dos trabalhadores injustiçados “penetraram até aos ouvidos do Senhor dos Exércitos” (Tg. 5:4).  
    No decorrer da história a igreja sempre teve voz profética, denunciando as mazelas morais e sociais do mundo. Os anabatistas denunciaram o autoritarismo dos sacerdotes e príncipes no século XVI. Os quakers condenaram o abismo social na Inglaterra do séc. XVII. Os ingleses John Wesley e William Wilbeforce lutaram contra a escravidão no século XVIII. O alemão Bonhoeffer morreu em um campo de concentração por combater o nazismo. E no século XX, uma das vozes mais marcantes em favor dos direitos civis foi a de um pastor: Martin Luther King. Sua voz e seus atos (sempre de não-violência) despertaram uma nação. Ele tinha um sonho: um país de negros e brancos que caminhavam e sentavam juntos. Por causa deste ideal ele foi morto, porém se colocou como alguém que clama por justiça. Certa vez, King afirmou em um discurso: “Não, não, não estamos satisfeitos e nunca o estaremos até a justiça deslizar como a água e a retidão como uma corrente poderosa”.[1]
    A igreja não deve se omitir, se esconder dentro de seus templos, enquanto a corrupção e a injustiça sufocam o nosso semelhante. Mas, devemos pedir direção ao Senhor sobre a melhor maneira de nos expressarmos, considerando que repudiamos atos de violência e vandalismo. Não devemos esquecer que toda boa dádiva vem do Pai das luzes. A Ele devemos clamar.
   Além disto, precisamos ter em mente que a mudança deve começar em cada um de nós. Para clamar por justiça, devemos ser justos; reclamar da corrupção, devemos ser honestos; pedir melhoria na saúde, devemos não sujar locais públicos, nem nos enchermos de álcool. Não podemos mudar o mundo, senão a nós mesmos. Como disse Ellul: "nós não temos que trabalhar, nos esforçar para que a justiça reine sobre a Terra: temos que, nós mesmos, sermos justos, portadores da justiça"[2].   
   A igreja evangélica na antiga Alemanha Oriental, nos deu um belo exemplo. ainda nos anos do comunismo. Philip Yancey conta que, durante o ano de 1989, quatro igrejas em Leipzig estavam organizando reuniões de oração. No início poucos se reuniam, doze no máximo. Depois de cada reunião, grupos de cristãos saíam pela cidade segurando velas e faixas em marchas pacíficas. Apesar da repressão policial, as multidões se formaram.
   No dia 9 de outubro, em meio a uma ameaça de massacre pela polícia, 70 mil pessoas marcharam pacificamente pelo centro de Leipzig. Uma semana depois 500 mil apareceram. O presidente Erich Honecker renunciou. No início de novembro, quase um milhão de pessoas marcharam através de Berlim oriental. Uma revolução poderosa, mas pacífica, estava em curso. Dias depois, o muro de Berlim veio abaixo. Nenhum tiro foi dado; nenhuma vidraça quebrada. Um jornal relatou: “As orações podem ou não mover montanhas, mas certamente mobilizaram a população de Leipzig”. Semanas após, uma faixa apareceu numa rua da cidade: “Wir danken Dir, Kirche” (Nós te agradecemos, Igreja)[3].   
                   






[1] SITKOFF. Harvard. Peregrinação ao topo da montanha. Lisboa. Editorial Bizâncio, 2009. p.147.
[2] ELLUL. Jacques. Cristianismo revolucionário. Brasília. Ed. Palavra, 2012, p. 68.
[3] YANCEY. Philip. Descobrindo Deus nos lugares mais inesperados. São Paulo. Mundo Cristão, 2005, p. 175/176.

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