Ralph W. Emerson
Era provavelmente a última vez que pai e filho iriam se ver. O filho era John Patton e ele estava indo para uma missão que muitos consideravam suicida: pregar aos nativos das Novas Hébridas. Alguns deles eram canibais e haviam dizimado uma expedição cristã anos antes. Patton narrou o final de uma caminhada com seu pai, de cerca de dez quilômetros, até à estação de trem que o levaria para distante de sua família: “No último meio quilômetro, ou perto disso, caminhamos juntos em um silêncio quase impenetrável [...] Seus lábios continuavam se movendo em oração silenciosa por mim, e suas lágrimas caíram rápidas quando nossos olhos se encontraram, pois toda fala era vã!”[1] Há silêncios eloquentes. Existem momentos em que palavras podem quebrar a sacralidade de uma cena de amor, de empatia.
O mundo é ruidoso; há muito barulho (e ruim) por toda a parte. Outrossim, a igreja parece seguir em um contínuo frenesi de vozes e sons vazios. Ocorre, que muitas vezes precisamos calar nossa voz. Sim, há uma virtude no silêncio. Muitas vezes pecamos quando simplesmente não ficamos calados.
A Bíblia relata o silêncio de Jesus em algumas ocasiões. Como sabemos que Ele nunca pecou, concluímos que Cristo calou exatamente quando devia. Certa vez, instigado pelo sumo sacerdote a se defender de falsas acusações, Mateus afirma que Jesus “guardou silêncio” (Mt. 26:62-63). Quando Pilatos lhe perguntou se não ouvia as acusações dos judeus, as Escrituras narram: “Jesus não respondeu nem uma palavra, vindo com isto a admirar-se grandemente o governador” (Mt. 27:14). Havia, inclusive, uma profecia sobre este momento do Messias: “Ele foi oprimido e humilhado, mas não abriu a boca; como cordeiro foi levado ao matadouro; e, como ovelha muda perante os seus tosquiadores, ele não abriu a boca” (Is. 53:7).
Há várias situações em que um cristão deve calar-se. Uma delas é mencionada pelo salmista Davi: “Disse comigo mesmo: guardarei os meus caminhos, para não pecar com a língua” (Sl. 39:1). Quantas conversas perniciosas já foram compartilhadas! Quantas palavras espúrias foram pronunciadas! Às vezes, falar pode trazer irritação, constrangimento ou incitar mágoa a outrem.
Muitas vezes, as palavras são apenas desnecessárias. Nunca esqueci o testemunho escrito pelo pastor Stephen Brown. Na primeira vez que teve que lidar com uma morte em sua congregação, ele passou por uma situação difícil. Preparou com cuidado as palavras para consolar a viúva. No entanto, ao chegar ao velório, esqueceu tudo. Tentou falar algumas palavras, mas fez tanta confusão que preferiu calar-se. Ficou, então, sentado no sofá, envergonhado e humilhado. Alguns dias mais tarde a esposa enlutada o procurou. Stephen começou a se desculpar, mas ela o interrompeu: “Pastor, quero agradecer-lhe tudo o que o senhor fez por mim. Não sei como poderia ter enfrentado tudo sem o senhor”. Com sinceridade, o pastor disse-lhe que não havia feito nada. Então, ela sorriu e disse: “O senhor esteve presente”.[2] Falamos, mas não somente com os lábios. Talvez, por isso a Bíblia diga: “seja pronto para ouvir, tardio para falar” (Tg. 1:19).
O silêncio também pode estar carregado de reverência. Ocorre quando estamos tão conscientes da presença de Deus que nos faltam forças e motivação para pronunciar qualquer palavra. O profeta Habacuque declarou: “O Senhor, porém, está no seu santo templo; cale-se diante dele toda a terra” (Hc. 2:20). Ficamos emudecidos perante a majestade divina. Reconhecemos nossa pequenez e Sua infinita grandeza. O sábio escritor de Eclesiastes afirmou: “Não te precipites com a tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra alguma diante de Deus; porque Deus está nos céus, e tu, na terra” (Ec. 5:2).
A.W. Tozer escreveu certa vez: “um progresso espiritual bem maior pode ser alcançado num curto momento de silêncio completo com temor diante da presença de Deus do que em anos de estudo, somente”[3]. Este silêncio não é o da frieza ou indiferença. Calamos não porque não temos nada a falar, mas porque não sabemos como expressar em palavras.
[1] Citado em PIPER. John, Completando as aflições de Cristo. São Paulo-SP, Shedd Publicações, 2010, p. 84.
[2] BROWN. Stephen. Quando a corda se rompe. Ed. Vida, 1990, p.91.
[3] Este mundo: lugar de lazer ou campo de batalha? Rio de Janeiro-RJ, Danprewans, 1999, p. 51.
Fonte: blog Graça e Saber (www.gracaesaber.com)
Fonte: blog Graça e Saber (www.gracaesaber.com)
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